[#3][especial] as consequências globais de “esquecer”

Notícias Liberdade de Expressão 01.02.2017 por Clarice Tambelli

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Quais seriam as consequências de um “esquecimento” aplicado em escala global? Essa pergunta resume um dos principais desafios relativos à implementação do direito ao esquecimento na atualidade e suscita reflexões no terceiro dia do Especial Direito ao Esquecimento promovido pelo InternetLab. Para entender mais, veja também o tema do Especial lançado ontem: europa e esquecimento: desafios de implementação.

A implementação do “esquecimento” na França e o posicionamento da CNIL

A decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia no caso Costeja vs. Google Espanha deixou a cargo dos buscadores a tarefa de receber, processar e determinar quais pedidos solicitando a desindexação de conteúdos deveriam ser atendidos.

Ao implementar os pedidos que considerava pertinentes, a Google limitava a desindexação aos domínios de origem desses pedidos, como Google.de ou Google.fr, de modo que os resultados continuavam aparecendo em buscas feitas de endereços de outros lugares do mundo, como Google.com ou Google.com.br. Isso sinifica dizer que você poderia acessar o Google.com da França e obter os resultados desindexados no domínio Google.fr. O argumento da empresa para ter se guiado pelo domínio de origem do pedido era o de que a desindexação em escala global resultaria na violação da liberdade de expressão em outros países.

Isso desagradou a autoridade de proteção de dados francesa, a CNIL (Comissão Nacional de Informática e Liberdades ou Commission Nationale de l’Informatique et des Libertés, em francês), que notificou a empresa exigindo que os resultados fossem excluídos de todos os endereços da empresa, isto é, que não fossem exibidos nas buscas realizadas nos sites da Google no mundo todo.

Em resposta, a Google decidiu expandir a remoção para um padrão de geolocalização do IP da pesquisa. Os resultados das buscas passaram, então, a serem desindexados para todos os usuários com IP do país de origem dos pedidos eventualmente aceitos pela Google, dentro da União Europeia. Na prática, isso significa que um pedido formulado por alguém na Espanha, por exemplo, e aceito pela Google, resultaria na remoção do link mencionado no pedido de todos os domínios europeus da empresa e a desindexação desse link em todos os demais domínios para usuários com IP espanhol. Ou seja: usuários localizados na Espanha, por exemplo, mesmo acessando o domínio Google.com não encontrarão os referidos resultados.

A CNIL, no entanto, segue considerando como inadequada a forma de implementação do direito ao esquecimento proposta pela Google, entendendo que a desindexação deva ocorrer de forma global. Isso significa dizer que, quando um cidadão francês pedir que seu nome seja desassociado de algum resultado de buscas na Internet, ninguém mais o encontrará, mesmo que a busca seja feita utilizando o endereço do Google nos Estados Unidos ou no Brasil, por exemplo. Com isso, a autoridade francesa interfere no acesso à informação do mundo inteiro.

Se os franceses puderem restringir o acesso a informações sobre eles na Internet, a possibilidade de se saber mais a seu respeito no futuro fica muito limitada. Pior: se o entendimento da CNIL se alastrar pela Europa, o acesso a informações sobre cidadãos de outros países europeus também será atingido.

Em resposta ao posicionamento da CNIL, a Google apresentou recurso ao Conseil d’État, a mais alta instância administrativa da França, e convidou entidades e especialistas ao redor do mundo a apresentarem sua contribuição ao debate. O InternetLab, convidado a manifestar-se sobre o assunto, submeteu declaração em que destaca os principais pontos de atenção decorrentes do posicionamento da CNIL. Veja o texto da declaração na íntegra aqui.

Equipe responsável pelo conteúdo: Thiago Dias Oliva (thiago.oliva@internetlab.org.br), Jacqueline Abreu (jacqueline@internetlab.org.br), Dennys Antonialli (dennys@internetlab.org.br) e Francisco Brito Cruz (francisco@internetlab.org.br).

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