Um raio-X do marketing digital dos presidenciáveis

O segundo relatório do Você na Mira analisa dados sobre os gastos das campanhas e o seu uso do impulsionamento de conteúdos.

Notícias Informação e Política 28.09.2018 por Heloisa Massaro, Francisco Brito Cruz e Beatriz Kira

Como já comentamos aqui, as eleições de 2018 serão as primeiras nas quais o “impulsionamento de conteúdo” será permitido como única forma legal de propaganda eleitoral paga na internet. Com o objetivo de trazer mais transparência para as campanhas eleitorais online, o InternetLab, em parceria com o WhoTargets.Me, lançou o projeto Você na Mira que permite monitorar o microdirecionamento de propaganda política no Facebook. Com base nos dados coletados durante o período eleitoral, estamos publicando uma série de relatórios sobre as ações de marketing digital das campanhas. O primeiro relatório cobriu todo o período de pré-campanha e olhou para algumas estratégias de impulsionamento dos pré-candidatos à presidência e ao governo de 12 estados.

Nesse segundo relatório, nosso objetivo foi produzir um raio-X preliminar das práticas de campanha digital das candidaturas. Para isso, essa análise abrangeu outras fontes de dados para além do Você na Mira e foi construída a partir de três camadas de informação: (i) os gastos de campanha declarados nas prestações de contas parcial à Justiça Eleitoral; (ii) as informações sobre anúncios fornecidas publicamente pelas empresas de internet; e (iii) anúncios e informações sobre direcionamento de conteúdo no Facebook coletadas pelo plugin Você na Mira.

Confira o relatório completo aqui.

As despesas dos presidenciáveis no primeiro mês de campanha

Nesse primeiro mês de campanha, a partir das prestações de contas parciais das/os candidatas/os, identificamos um cenário no qual as despesas com impulsionamento ficaram concentradas no Facebook e Google, e representaram uma fração pequena dos gastos declarados até agora à justiça eleitoral. Ainda que haja uma diferença significativa de orçamento entre as campanhas, nenhuma campanha investiu de forma massiva no impulsionamento de conteúdo, se considerarmos os gastos totais de cada uma. Em uma análise comparativa com os valores destinados à produção audiovisual, o gasto com impulsionamento se apequena ainda mais, representando uma fração diminuta.

Dentre os primeiros colocados nas pesquisas eleitorais, com mais de 5% de intenções de voto, um ponto interessante sobre as despesas a ser observado é a ausência de gastos do candidato Jair Bolsonaro com impulsionamento de conteúdos nesse período. De acordo com os dados da prestação parcial de contas e da Biblioteca de Anúncios do Facebook, o primeiro colocado nas pesquisas de intenções de voto não impulsionou nenhum anúncio no Facebook no primeiro mês de campanha. Ainda assim, apesar da ausência de propaganda paga na internet, o candidato mantém o maior nível de engajamento nas redes sociais e apresentou o maior índice de interesse nas plataformas do Google no Brasil nos últimos 30 dias, de acordo com levantamento do GoogleTrends.

Gráfico 2. Interesse por candidatos nas plataformas do Google no Brasil nos últimos 30 dias.

Em face dessa desproporção entre o investimento da campanha de Bolsonaro com mídias sociais e a relevância do candidato nesses espaços, dois pontos devem ser levados em conta na análise desse fenômeno:  (i) a capilar rede de candidaturas a governador, senador e a deputado federal e estadual que apoiam o presidenciável do PSL em seus respectivos impulsionamentos, numa espécie de “impulsionamento cruzado” não controlado diretamente pelo CNPJ da candidatura presidencial; e (ii) as capacidades de aproximar voluntários e de gerar engajamento espontâneo nas redes sociais demonstradas pelo candidato. Corroborou-se a hipótese de que a força política da candidatura de Bolsonaro nas redes sociais é um fenômeno resultante de um esforço distribuído, capilar e voluntário, que é visivelmente maior do que seus adversários.

O uso da ferramenta de impulsionamento do Facebook pelos presidenciáveis

Ainda que as campanhas tenham investido relativamente pouco em impulsionamento de conteúdos, é interessante olhar para a qualidade dessas despesas, ou seja, como o dinheiro é gasto. As campanhas de Henrique Meirelles, Guilherme Boulos e João Amoêdo se destacaram nesse sentido, por tentarem agregar elementos de microdirecionamento e de estratégia de comunicação às suas campanhas.

Dentre os anúncios identificados pelo Você na Mira nesse primeiro mês de campanha, mantiveram-se alguns diagnósticos já levantados no último relatório com relação às estratégias de impulsionamento de conteúdo pelas campanhas à presidência, como, por exemplo, o direcionamento de propaganda para um público mais jovem, no caso de Guilherme Boulos. Não obstante, algumas outras práticas merecem destaque.

Dentre as campanhas das/os candidatas/os à presidência, uma estratégia de direcionamento a ser notada foi o uso pelo candidato João Amoêdo do impulsionamento do Facebook para alcançar pessoas semelhantes “aos seus clientes”. Essa funcionalidade permite ao anunciante criar um público personalizado a partir de determinadas características e direcionar anúncios para pessoas semelhantes. O uso dessa ferramenta é um indício do emprego de estratégias mais sofisticadas de direcionamento pelo candidato que, em razão do menor tempo de TV e da ausência nos debates, depende mais das redes sociais para divulgação de sua candidatura.

Rationale de anúncio veiculado pelo candidato João Amoêdo para pessoas que podem ser semelhantes aos seus clientes.

Merecem destaque também os anúncios dos candidatos Henrique Meirelles e Guilherme Boulos direcionados para mulheres. Em uma eleição na qual o primeiro colocado nas pesquisas de intenções de voto veicula discursos sexistas e apresenta uma alta taxa de rejeição dentre as mulheres, é interessante olhar para as estratégias de comunicação dos demais candidatos com essa fração do eleitorado.

Meirelles impulsionou um vídeo no qual ele critica a ausência de propostas para mulheres no plano de governo de Bolsonaro, que foi direcionado para um público interessado em mulher e para uma audiência composta por mulheres de 18 anos ou mais. Já Guilherme Boulos impulsionou um vídeo de um trecho de sua participação no Debate da Band no qual ele apresenta suas propostas para as mulheres. Essa propaganda foi direcionada para um público interessado em feminismo e para uma audiência composta por mulheres de 16 a 40 anos.

Rationale de anúncio veiculado pelo candidato Guilherme Boulos para pessoas interessadas em feminismo e mulheres de 16 a 40 anos.

O relatório completo com todos os dados coletados pela equipe nesse primeiro mês de campanha está disponível e pode ser acessado aqui.

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Equipe responsável pelo conteúdo: Heloisa Massaro e Francisco Brito Cruz . Colaborou Beatriz Kira.

Equipe do projeto: Francisco Brito Cruz, Lucas Lago, Heloisa Massaro, Sam Jeffers e Louis Knight-Webb.

Equipe institucional: Mariana Valente e Dennys Antonialli.

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