InternetLab e NDIS-USP levam nota técnica sobre violência de gênero na Internet a Brasília

Notícias Desigualdades e Identidades 13.12.2016 por Clarice Tambelli

Na semana passada, o InternetLab e alunos representantes do Núcleo de Direito, Internet e Sociedade da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (NDIS/USP) estiveram em Brasília para entregar a nota técnica que elaboraram sobre o PL 5555/2013, que criminaliza a divulgação de imagens íntimas não consentidas na Internet. O documento é fruto do trabalho dos alunos participantes do módulo sobre violência de gênero na Internet realizado no NDIS/USP no primeiro semestre de 2016, em parceria com o InternetLab, que vem empreendendo pesquisa sobre o tema no âmbito da linha “Internet e Gênero, Raça e Outros Marcadores Sociais”.

Com a visita, os alunos Priscila Esteves e Gianluca Martins Smanio tiveram a oportunidade de discutir suas conclusões com a relatora do projeto, Deputada Tia Eron, que decidiu incorporar algumas das sugestões ao texto do projeto. Além disso, os alunos se reuniram com a com a Procuradoria Especial da Mulher, no Senado Federal e os assessores da Deputada Maria do Rosário. Além das reuniões e das mudanças que trouxeram ao projeto em discussão, a experiência visou aproximar os alunos do dia-a-dia do Congresso Nacional, chamando sua atenção para estratégias efetivas de mobilização e incidência.

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Da esquerda para a direita: Juliana Ruiz, Dennys Antonialli, Gianluca Smanio, Priscila Esteves e Natália Neris.

Abaixo você confere mais sobre a programação em Brasília, os resultados da experiência e as impressões dos alunos participantes bem como informações sobre a parceria entre InternetLab e NDIS/USP e o processo de elaboração da nota.

Reunião com a Deputada Tia Eron

No dia de nossa visita, 07/12, o PL 5555/2013 estava na pauta de votação da Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados, o que tornou a experiência ainda mais enriquecedora. Antes da reunião, analisando a nota técnica que havíamos enviado, a equipe da relatora do projeto, Deputada Tia Eron, havia decidido acatar uma das sugestões dos alunos no sentido de incluir no texto do projeto um dispositivo exigindo a retirada do conteúdo no prazo de 24 horas após notificação da vítima.

Depois de conversar com os alunos, a Deputada se convenceu a realizar outra alteração: a substituição do termo “consentimento” pelo termo “autorização”. Isso porque, de acordo com as conclusões da nota técnica, é muito difícil provar, em uma ação judicial, que não existiu consentimento da vítima. Na visão dos alunos, a substituição pelo termo “autorização” favorece a vítima, na medida em que inverte o ônus da prova, isto é, o ofensor é que passa a ter que provar que tinha autorização para divulgação das imagens.

Embora estivesse na pauta de votação, a sessão da CCJC foi encerrada antes de o projeto ter sido votado. A expectativa é que ele seja votado e aprovado, já com as alterações realizadas pela Deputada, nesta semana.

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Da esquerda para a direita: Gianluca Smanio, Dennys Antonialli, Priscila Esteves, Natália Neris e Juliana Ruiz
Da esquerda para a direita: Gianluca Smanio, Dennys Antonialli, Priscila Esteves, Natália Neris e Juliana Ruiz
Da esquerda para a direita: Gianluca Smanio, Dennys Antonialli, Priscila Esteves, Tia Eron e Natália Neris
Da esquerda para a direita: Gianluca Smanio, Dennys Antonialli, Priscila Esteves, Tia Eron e Natália Neris

Procuradoria Especial da Mulher no Senado Federal

Em reunião com a coordenadora Rita de Cássia Poli Rebello, a assessora de comunicação  Ramíla Moura e o jornalista Lunde Braghini Júnior, os alunos puderam conhecer os projetos de atuação da Procuradoria e discutir estratégias de mobilização para a pauta de violência de gênero no Congresso. Foram abordadas questões sobre o estágio atual de tramitação do PL 5555/2013 e suas perspectivas de aprovação no plenário da Câmara e encaminhamento ao Senado.

Especificamente em relação à nota técnica, os alunos destacaram sua preocupação no sentido de o projeto propor alterações à Lei Maria da Penha. Nesse sentido, argumentaram que a lei – considerada uma das melhores do mundo – já contempla os casos de disseminação não consentida de imagens íntimas no âmbito dos artigos que definem os tipos de violência moral e psicológica. Ressaltaram também que sua elaboração fora fruto de um amplo processo de discussão – também com atores extra-parlamentares como ativistas feministas – posicionamentos que foram corroborados pelos representantes da Procuradoria.

Um outro resultado positivo do encontro foi o comprometimento do órgão em cadastrar em seu portal o estudo elaborado pelo InternetLab sobre o tema (o livro “O Corpo é o Código: estratégias jurídicas de enfrentamento ao revenge porn”), bem como a nota técnica elaborada pelos alunos do NDIS/USP.

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Da esquerda para a direita: Priscila Esteves, Juliana Ruiz, Natália Neris, Ramíla Moura, Lunde Braghini Junior, Gianluca Smanio e Dennys Antonialli

 

Gabinete da Deputada Maria do Rosário

Fomos recebidos pelos assessores da Deputada Maria do Rosário, também muito envolvida com as questões de gênero e titular da Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania, pela qual tramita o PL 5555/2013. Depois de analisar a nota técnica, os assessores se comprometeram a estudar mudanças e as julgando pertinentes pedir vistas quando da votação.

Depoimento dos alunos do NDIS-USP

Priscila Esteves, aluna do quinto ano de direito da USP

“Vivenciar um dia no congresso me permitiu compreender um pouco do que é o processo legislativo na prática e a importância da participação e da fiscalização da sociedade civil na atuação dos deputados e senadores. Os políticos são pessoas como nós e a formação deles é a mais variada possível, daí porque foi muito importante e desafiador explicar, da forma mais simples possível, problemas jurídicos a pessoas leigas no assunto.

Com a elaboração da Nota Ténica e a viagem à Brasília aprendi muito. Aprendi a importância de uma linguagem clara, concisa e de organização na exposição de ideias para interlocutores que não possuem a mesma bagagem e conhecimento de mundo que o meu. Aprendi a lidar com a insegurança e com o imprevisível. Quantas vezes pensei que não conseguiria atingir o resultado esperado? E a surpresa quando o cronograma da viagem alterou, de última hora? As dificuldades existem, e superá-las é indescritível. Aprendi, também, a importância do trabalho em grupo: apesar de apenas eu e outro colega termos ido até o congresso, é preciso ressaltar que isso só foi possível devido à participação e ao empenho de todos nossos colegas que contribuíram com as discussões e com a redação da Nota ao longo do primeiro semestre de 2016 (obrigada a tod@s!).

Por fim, carrego a satisfação e a alegria de ter participado, ao menos um pouquinho, na luta contra a violência de gênero e, especialmente, na luta contra os crimes que afetam a dignidade sexual, tema tão íntimo e significativo para todos nós”

Gianluca Martins Smanio, aluno do quarto ano de direito da USP

“Não há palavras para descrever, de forma completa e justa, a experiência de montar uma nota técnica em grupo e de viajar até Brasília, adentrar o Congresso Nacional e entregar este trabalho feito por nós, alunos, com a finalidade de (tentar) aprimorar um importante projeto de lei. É a participação por excelência do processo legislativo, acompanhar uma sessão na Comissão de Constituição e Justiça, conversar com a Deputada Tia Eron, relatora do PL 5.555/2013, que trata sobre a criminalização do compartilhamento sem autorização de imagens íntimas, e conversar com a parlamentar e sua equipe de modificações que gostaríamos de ver inclusas no projeto, foram momentos marcantes que podemos dizer que fizemos a diferença. Ver que um parágrafo que seja foi incluído na íntegra no voto que seria apresentado foi uma enorme vitória. A recepção aos nossos comentários foi um enorme prazer, para não dizer surpresa,

 Ao longo do dia, passamos por outras reuniões, como na Procuradoria Especial da Mulher no Senado, que nos deixou muito surpresos com demandas similares à nossa nota técnica. A recepção do nosso trabalho, devido à importância do tema, foi imediata e a conversa muito frutífera. Formar aliados na luta ao combate à violência de gênero na internet é sempre uma oportunidade única e interessante a ser levada em muitíssima consideração. O que mais me impressionou de todo o dia foi a recepção ao nosso grupo e trabalho, que foi agradável e até carinhosa, demonstrando real interesse com o que nós tínhamos a dizer.

No final, podemos garantir que foi uma experiência única. Poder conviver com o Legislativo por um dia, batalhando por uma causa da qual temos convicção é especial. Agradecemos ao InternetLab pela oportunidade, e a todos os nossos colegas que suaram conosco para construir esta nota, perderam noites de sono e montaram esse projeto sensacional. Sem o conjunto de todos, nada disso seria possível.”

InternetLab e o NDIS-USP: a parceria

Desde o começo deste ano, nos termos do artigo 2o da Deliberação CCEx-FD no 01 de 24/09/2015, o InternetLab atua em parceria com a Faculdade de Direito da USP, sendo a entidade responsável pelo desenvolvimento das atividades do Núcleo de Direito, Internet e Sociedade (NDIS-USP), disciplina de cultura e extensão oferecida aos alunos de graduação.

Sob supervisão do Prof. Dr. Virgílio Afonso da Silva, o NDIS existe desde 2012. Sua intenção é promover pesquisas e desenvolver reflexões sobre os desafios impostos ao direito pelos avanços da tecnologia, sobretudo no campo da Internet. Para tanto, além de discussões sobre textos teóricos, o NDIS conta com a participação de convidados representantes dos setores público e privado e com a realização de atividades práticas que incentivam o contato com estratégias de incidência (simulações de audiências públicas, elaboração de notas técnicas, amici curiae, etc). As atividades de pesquisa do NDIS privilegiam o estudo de políticas públicas e regulação, aproximando as áreas de direitos fundamentais e sociologia jurídica. Além disso, o NDIS também realiza eventos de debate na FDUSP e participa de audiências e consultas públicas. É possível acompanhar as atividades do NDIS pelo seu grupo e pela sua página no Facebook e na Wikiversidade.

Estudos sobre violência de gênero na Internet

Ao longo do primeiro semestre de 2016, as atividades do NDIS se focaram nas questões de violência de gênero na Internet, sob coordenação de Mariana Valente, Natalia Neris e Francisco Brito Cruz. O objetivo do programa era colocar os alunos em contato com os principais argumentos envolvidos nessas discussões e debater as possíveis estratégias jurídicas para seu enfrentamento. Além disso, os alunos debateram os diagnósticos da linha de pesquisa sobre violência de gênero do InternetLab, que deram origem ao livro “O Corpo é o Código: estratégias jurídicas de enfrentamento ao revenge porn no Brasil“.

Parte das discussões envolveu a análise de projetos de lei sobre o assunto, e a partir do estudo do Substitutivo ao PL 5555/2013 – ao qual fora apensados os demais projetos sobre a matéria – os alunos elaboraram uma nota técnica conjunta sobre seus dispositivos, cujo sumário executivo apresentamos abaixo.

[sumário executivo]

 

Por Dennys Antonialli e Natália Neris

 

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